"A problemática relação entre Executivo e Legislativo, que envolveu a derrocada de Collor, ainda é tema atual"
Por Cláudio Andrade
No ano de 1992, os brasileiros testemunharam a abertura do processo de
impeachment do então Presidente da República, à época, Fernando Collor
de Mello (“o caçador de marajás”).
Para os que não sabem, o Impeachment foi uma condenação política e não judicial. Na Câmara dos Deputados, o afastamento de Collor foi aprovado por 441 votos, concedendo ao alagoano o rótulo de primeiro Chefe da República - eleito pelo povo após o regime militar -afastado de suas funções.
Para que o afastamento do Presidente fosse efetivamente votado, duas
entrevistas foram cruciais e bombásticas. Primeiramente, o irmão de
Fernando, Pedro Collor, disse à Revista Veja, que havia um esquema ‘PC’,
com desvio de verbas públicas para as empresas do ex-tesoureiro de
campanha, Paulo César Farias. Depois, o motorista Francisco Eriberto
França confirmou, na revista semanal ‘Isto É’, ter feito pagamentos para
Fernando Collor e sua esposa, Rosane Collor, com cheques adquiridos nas
empresas de PC Farias.
Diante da repercussão bombástica dessas entrevistas e de uma CPI
(Comissão Parlamentar de Inquérito), que deu procedência às tais
denúncias, a Câmara dos Deputados se viu instada a votar pelo
afastamento do Presidente, o que ocorreu em clima apoteótico.
Todavia, até hoje, muitos creditam a saída de Collor a dois motivos: o
movimento ‘caras pintadas’ e uma possível condenação judicial no STF.
Ambas as hipóteses, considero equivocadas.
Com relação aos ‘caras pintadas’, tratou-se apenas de um movimento, que
pegou carona nas ações políticas negativas divulgadas pela imprensa, e
que, em hipótese alguma, teria influência direta no afastamento de
Collor. Foi tão somente uma movimentação popular, digna de aplausos, mas
de pouca eficácia nesse contexto.
Em relação à eventual condenação judicial, vale dizer que, no ano de
1994, o ex-presidente Fernando Collor foi absolvido, no Supremo Tribunal
Federal, da imputação de corrupção passiva. Tal absolvição deu-se em
virtude de falta de provas, consolidando a máxima de que a saída de
Collor foi exclusivamente de caráter político. Após esses relatos,
pode-se afirmar, com convicção, que Fernando Collor de Mello perdeu o
posto de Chefe do Executivo Federal por não ter angariado o apoio
político necessário e crucial do Congresso Nacional (Câmara e Senado).
A problemática relação entre Executivo e Legislativo, que envolveu a
derrocada de Collor, ainda é tema atual. Isto pode ser nitidamente
constatado, nas eleições municipais que ocorrerão em todo o país no
próximo domingo, quando observamos a ansiedade dos candidatos a prefeito
de elegerem o máximo possível de vereadores do respectivo grupo a que
pertencem. Os candidatos a prefeito temem que suas eleições se deem sem o
apoio da Câmara uma vez que uma Casa de Leis, politicamente contrária à
sua gestão, dá a sua estagnação administrativa como certa.
Salvo melhor juízo, nenhum presidente da República, governador de
Estado ou prefeito, tem a habilidade política necessária para
administrar bem sem o apoio das respectivas casas legislativas. Essa
relação, por muitas vezes, acaba se tornando temerária diante do
engessamento administrativo ao qual o Executivo se submete quando o
Legislativo não tem seus interesses atendidos.
Assim, mesmo após vinte anos do impeachment, podemos constatar que, em
termos de articulação política, o Brasil apresentou poucas mudanças. Os
abutres e as carniças permanecem, no cenário, em um binômio mutante de
amor e ódio.
Certamente, vê-se que em se tratando de política, não obstante passadas
duas décadas, nosso país tem a peculiaridade de apresentar quase que os
mesmos problemas, com um cenário político onde mudam os personagens e
as “caras pintadas”, mas o sistema de manutenção de poder continua o
mesmo.
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