Leiam o texto abaixo publicado na Folha de São Paulo de ontem e comentem.
Obs: O título da postagem é nosso.
Obs: O título da postagem é nosso.
"QUANDO INGRESSEI na magistratura, em janeiro de 1989, um magistrado que, na época, não aceitava bem a idéia de que mulheres pudessem fazer parte do Judiciário, disse em tom de chiste que não concebia mulher judicando porque, afinal, Deus era homem e, assim, os juízes só poderiam ser do sexo masculino. Acrescentou, com o gesto de uma lactante: imaginem uma mamada entre um despacho e outro!
Não sei o que mais me chocou, se a discriminação contra as mulheres, que eram em número reduzidíssimo, ou se o fato de, ainda que em tom de brincadeira, algum juiz pudesse se considerar um ser divino -portanto, com poderes absolutos e ilimitados.
Essas lembranças vieram à tona ao ler na edição da Folha de 11/11 uma frase que teria sido dita por um juiz: "A Constituição não é mais importante que o povo, os sentimentos e as aspirações do Brasil. É um modelo, nada mais que isso ( ...) não passa de um documento; nós somos os valores, e não pode ser interpretado de outra forma: nós somos a Constituição, como dizia Carl Schmitt". Teria ainda acrescentado que determinados delitos "obrigam à adoção de atitudes não-ortodoxas".
A idéia de que cada juiz é a própria Constituição ou o verdadeiro soberano encarna o totalitarismo do qual a humanidade foi vítima recente.
Valiosa a lição de Roberto Romano, que, referindo-se a Carl Schmitt, diz: "Escutemos nosso realista: "o führer defende o Direito contra os piores abusos quando, no instante do perigo e em virtude das atribuições de supremo juiz, as quais, enquanto führer, lhe competem, cria diretamente o Direito". O magistrado sublime decide: certos indivíduos, grupos, setores sociais, étnicos e religiosos são amigos ou inimigos. Dadas as premissas, conhecemos as conseqüências. É relativamente fácil recuar, horrorizados, diante do decisionismo jurídico. Suas mãos mostram excrementos de sangue" (prefácio de "Razão Jurídica e Dignidade Humana", de Marcio Sotelo Felippe).
A concepção adotada revela a visão absolutamente distorcida da democracia e do verdadeiro papel do juiz em uma ordem democrática. Os juízes e o Judiciário estão subordinados ao povo, nos termos do ordenamento jurídico democraticamente construído, e não podem se sobrepor a isso supondo-se eles mesmos o espírito do povo. É a "polis" que determinou, na Constituição e nos tratados internacionais, qual é a sociedade que almeja, sob quais princípios, fundamentos e patamares éticos. O juiz não substitui essas diretrizes pelas suas.
No que tange à matéria penal e processual penal, inaceitável supor conduta "não-ortodoxa", pois são temas em que é intensa a intervenção do Estado no plano da liberdade. Os limites são rígidos e não podem ser ultrapassados, muito menos por um juiz que tem como função evitar que órgãos públicos ou privados, sob qualquer pretexto, os violem.
Mas o bom combate contra tais concepções não pode servir de pretexto para uma investida contra a liberdade de expressão. Vislumbra-se esse risco em debates recentes no próprio Judiciário.
A liberdade de expressão é cláusula pétrea da Constituição. A Convenção Americana de Direitos Humanos estabelece que toda pessoa terá o direito à liberdade de expressão, que inclui a liberdade de buscar, receber e difundir informações e idéias de qualquer natureza, independentemente de considerações de fronteira.
Reafirmando esse princípio, a corte interamericana sustentou (opinião consultiva número 5/85) que: "A liberdade de expressão é pedra angular da existência mesma de uma sociedade democrática. É indispensável para a formação da opinião pública. É também condição "sine qua non" para que os partidos políticos, os sindicatos, as sociedades científicas e culturais e quem em geral deseje influir sobre a coletividade possam se desenvolver plenamente. É, enfim, condição para que a comunidade, na hora de fazer escolhas, esteja suficientemente informada. Assim, é possível afirmar que uma sociedade que não está bem informada não é plenamente livre".
Os juízes, evidentemente, gozam dos mesmos atributos dos demais seres humanos. No 7º Congresso das Nações Unidas, o tema mereceu especial destaque, estabelecendo a organização dos princípios básicos relativos à independência judicial, dentre eles a normativa de que de juízes, assim como dos demais cidadãos, não podem ter subtraídos os direitos de liberdade de expressão, associação, crença e reunião, preservando a dignidade de suas funções e a imparcialidade e independência da judicatura.
"Magistrados, de qualquer instância, não são deuses, não criam nem destroem, devem garantir o sistema democrático".
Vocês concordam? comentem.
3 comentários:
Qual é a diferença entre um juiz e Deus?
É que Deus sabe que não é juiz.
Aqui em Campos parecem que são. Não defendo Arnaldo nem Rosinha, mas pereceu que o processo eleitoral em campos tinha um dedo aqui e ali de algun juiz,ora em proveito de um ora em proveito de outro .Sabendo destes acontecimentos se enibe a candidatura de pessoas idoneas que preferem não se canditar pois sabem que o jogo eleitoral é cartas marcadas. Este é o comentario mais ouvido na rodas de bares, esquinas, colegios enfim na cidade toda.Espero que isto não traga a população nenhum estrago posterior,pois sabemos que a maioria dos juises trocam de cidade e a gente que se dane caso esta intervenção tenha ocorrido em prejuiso da população.A proposito eles não deveriam querer ser Deus pai ,mas apenas procurar imita-lo a população do Brasil agradeceria. Francisco.
Nossa liberdade é relativa, por mais "plena" que possa parecer. Somos obrigados a falar um idioma, a ter determinados hábitos, crenças etc.. Somos seres de escolhas, mas escolhemos de acordo com nossa cultura, ou seja, a liberdade de escolha já estaria prejudicada, pois somos frutos de um passado, nascemos em um mundo já dado. Os magistrados, então, julgam de acordo com seus conceitos, pré-conceitos e interesses segundo suas crenças. Como no país não há nenhum poder sobre o Judiciário (eles julgam a si próprios, pois não há controle externo), os juízes pensam que são deuses e os desembargadores e ministros têm certeza. Mudar essa realidade? Só uma revolução popular é capaz de tanto. Mas ela está tão distante que jánão mais a visualizamos no horizonte.
Avelino Ferreira
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