Jornal Terceira Via
O Presidente do Supremo Tribunal Federal e relator do processo do Mensalão, Ministro Joaquim Barbosa, foi eleito uma das cem pessoas mais influentes do mundo pela revista americana “Time”.
Não restam dúvidas de que a referência é merecedora, notadamente por se tratar de um negro brasileiro que não é jogador de futebol tampouco uma ‘estrela’ do mundo artístico.
Por coincidência, na última semana, assisti à primeira parte da entrevista concedida pelo ilustre ministro ao ator Lázaro Ramos, no programa “Espelho” no canal Brasil.
Naquela entrevista, o ministro identifica os principais pontos de dificuldade que ele teve que superar para que, como relator do Mensalão, pudesse alcançar o topo do Judiciário brasileiro.
A luta de Joaquim Barbosa é a mesma de muitos outros cidadãos brasileiros negros e menos abastados. Todavia, parcela mínima consegue o êxito de Barbosa uma vez que as circunstâncias da luta de cada um são diferentes.
Barbosa é descrito, na revista “Time”, como um garoto pobre e filho de pedreiro, que trabalhou como faxineiro e datilógrafo no Senado, para ajudar no custo do seu curso de Direito. Não restam dúvidas de que seu histórico de vida é louvável, mas vai de encontro à realidade de nosso país tendo em vista que poucos obtêm o êxito que Barbosa alcançou.
Um negro pobre no Brasil possui chances ínfimas de chegar a um cargo público que lhe traga a estabilidade necessária para a sua formação ética e moral. Isso porque o Brasil carrega até hoje, em seu histórico social, os resquícios dos séculos da escravatura, quando o negro era uma mera mercadoria.
Hoje, grande parte deles ainda está fora do mercado de trabalho ou inseridos em empregos de menor relevância e com remuneração aquém do merecido.
Na sociedade, eles ainda sofrem com a discriminação imposta pelo homem branco cuja hipocrisia é alarmante ao afirmar que não é preconceituoso e se portar de forma contraditória.
Os filhos dos negros sentem, na pele, tratamento diferente nos bancos escolares, nos clubes e academias. Nas instituições bancárias, as exigências para abertura de uma conta ainda são um suplício e nos relacionamentos amorosos com os brancos, ainda se pode constatar a indiferença da família clara para com o visitante negro.
Outro ponto que ainda fere o âmago do negro são as expressões pejorativas como “negrinho”, “vala negra” e “macaco”. Palavras que estão inseridas no seio social como regra quando, na verdade, deveriam ser banidas.
Não se trata de desmerecer as qualidades do Ministro Joaquim Barbosa, que ostenta doutorado na Sorbonne, domina quatro línguas estrangeiras e se tornou professor visitante no Instituto de Direitos Humanos, da Escola de Direito de Columbia.
Porém, essas idolatrias, focadas na cor/pobreza, como exemplos de superação e conquista são perigosas, pois conferem fôlego ao Poder Público que, até hoje, não se empenhou em dignificar o ensino público (apesar dos programas sociais) e reduzir a pobreza nacional.
Essas idolatrias isentam o Poder Público da responsabilidade de conferir a todos os cidadãos o mesmo tratamento e as mesmas oportunidades.
Não restam dúvidas de que precisamos de mais negros no mercado, na imprensa, nas empresas privadas e no Judiciário. Para isso, é preciso que haja ações conjuntas entre os setores públicos e privados para que o sonho concretizado de Joaquim Barbosa seja o de milhares de negros e pobres que, neste exato momento, sonham com uma capa na revista TIME.
Cláudio Andrade.