quarta-feira, 23 de julho de 2014

O esquema político na visão de um magistrado



Caros leitores, fui contemplado com a obra “O nobre deputado”. Como está escrito na própria capa, trata-se de um relato chocante e verdadeiro de como nasce, cresce e se perpetua um corrupto na política brasileira.

O autor do livro, que li de uma tacada só, é o juiz de Direito, titular da 58ª Zona Eleitoral do Maranhão, Marlon Reis. Nas 118 páginas, ele narra as ações vividas por deputados federais para se manterem no poder.

Inicialmente, salta aos olhos a gana que esses deputados federais possuem em relação às emendas parlamentares, aos convênios e às licitações. Esse triângulo, previsto em leis, são as vias de acesso dos políticos ao dinheiro, muito dinheiro, que servirá para alimentar a máquina política visando à concretização do poder.

As páginas trazem também a figura do caixa três. Isso mesmo. Não me equivoquei. Caixa três! Trata-se do apoio transverso que, por exemplo, uma empresa dá ao candidato sem que ele esteja recebendo, de forma direta, o dinheiro ou benefício.

Nesse contexto, uma empresa que faz material publicitário de seus produtos em uma determinada gráfica aproveita o ano eleitoral e inclui, no pacote de serviços requeridos, a gráfica o material de campanha daquele político que a empresa resolveu apoiar.

Nessa linha de ação, a empresa coloca na rua o material do candidato sem que ele (o político) e ela (a empresa) sejam vinculados um ao outro. O material vai para a rua como em um passe de mágica; como se brotasse do solo.

Segundo o magistrado, em seu livro, a agiotagem também é muito forte dentro do Congresso. Trata-se de uma operação que movimenta milhões de reais; porém, é uma ‘faca de dois gumes’.

O motivo é o seguinte: o agiota entra na campanha sempre quando o candidato está prestes a vencer ou a perder um pleito eleitoral. Quando o candidato está bem nas pesquisas, o agiota oferece aquela quantia final que, bem utilizada, irá dar o "up" que o postulante necessita para ultrapassar o seu adversário.

Animado, o candidato pega a grana emprestada e, contando com a sua eleição ou reeleição, já inclui o pagamento. Porém, quando as coisas não ocorrem como o esperado, a cobrança é complexa e, às vezes, mortal.

Vale ressaltar que a figura dos agiotas já mudou bastante. Hoje, eles entram para o parlamento e se tornam deputados, sendo que em uma determinada assembleia legislativa, chegou-se a ter três parlamentares ‘negociadores’ de dinheiro.

Outra questão abordada no livro é o foro privilegiado. Apesar de saber qual a finalidade real dessa prerrogativa parlamentar, faço questão de transcrever, na íntegra, as palavras contidas na obra do magistrado maranhense. Disse ele que “o foro privilegiado significa ser julgado pelas pessoas que frequentam as mesmas festas que nós. Gente que representa um poder cujo orçamento é definido pelo parlamento”.

Confesso que gostar de estudar os meandros políticos é para poucos. A ciência, tão linda nos livros doutrinários, se transforma em um ‘monstro’ na prática, com centenas de tentáculos operacionais que nos mostram o quanto somos inocentes.

Essa política, retratada no livro “O nobre deputado”, é aquela que elimina as chances de qualquer homem de bem, que sonha em atuar pelo povo e para ele.

Há solução? Não sei. Prefiro parafrasear o saudoso Rubem Alves, que disse de forma célebre que não haverá borboletas se a vida não passar por longas e silenciosas metamorfoses.

Quem sabe um dia, o Sistema político mude e a sapiência e os valores éticos tomem o lugar do’ esquema’ e da troca de favores?

Cláudio Andrade.

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