Trata-se da Medida Provisória 514 de 01/12/2010, convertida na Lei 12.424 em 16/06/11.
Por meio da inclusão do artigo 1.240-A no Código Civil instituiu-se em nosso ordenamento nova modalidade de usucapião, segundo a qual “Aquele que exercer, por dois (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinqüenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.”.
Ao meu sentir trata-se de um retrocesso, além de haver um interesse do poder público incluso sorrateiramente nesse contexto. Como advogado familiarista vejo o retorno dessa figura jurídica de abandono de lar um desserviço à sociedade.
Quantas mulheres espancadas, ameaçadas de morte e estupradas permaneciam residindo com seus algozes por receio de perderem seus bens?
Agora, a forma como se deu o rompimento fático do casal – mais especificamente com ou sem abandono do lar – definitivamente poderá produzir efeitos patrimoniais entre as partes.
A possibilidade de saírem do ambiente aterrador e ingressar em Juízo para receberem os seus direitos patrimoniais tem evitado grandes tragédias, ou seja, verdadeiras mortes anunciadas foram abortadas.
Com essa alteração, o perigo ronda novamente os lares brasileiros. A própria Lei Maria da Penha será afetada, afinal a mulher agredida que já encontra enorme dificuldade para registrar o fato nas delegacias, ainda terão que dirigir-se ao cartório e deixar expresso o seu desejo de repartir o imóvel. No cartório, por lei, haverá necessidade de comprovar a metragem do terreno, que deverá ser de no máximo duzentos e cinqüenta metros quadrados.
Isso na prática burocrática cartorária será terrível, principalmente diante daquelas mulheres ameaçadas de morte ou inclusas nos programas de proteção a testemunhas.
Outra questão a ser debatida é o conceito de família. O artigo 226 da Constituição Brasileira elenca um rol exemplificativo onde as famílias oriundas do casamento, união estável e monoparentais são consideradas entidades familiares. Além disso, o Supremo Tribunal Federal igualou a união estável as homoafetivas. Pergunta-se: todos esses cônjuges, companheiros e parceiros estarão inclusos no conceito familiar para efeito dessa alteração legislativa, quando deixarem seus lares?
Outra indagação: Porque somente imóveis urbanos e com metragem específica de duzentos e cinqüenta metros quadrados? Aqueles que residirem em lares acima da metragem especificada e tiverem que deixar seus ambientes estarão desprotegidos? Fadados à vala comum do Judiciário?
Ao meu sentir existem interesses públicos por trás dessa alteração, pois as mesmas foram realizadas dentro de um pacote de medidas para o programa “Minha Casa, Minha Vida” do Governo Federal.
Será que a máxima de que todos são iguais perante a lei, mas cada um na sua classe será declarado? Entendo que o legislador está impondo uma penalidade patrimonial para aquele que abandona o lar
Eis a minha contribuição ao debate.
Cláudio Andrade.