Nas últimas 12 horas, três pacientes do Hospital Geral de Guarus (HGG) morreram nos corredores devido à falta de vagas no Centro de Terapia Intensiva (CTI) da Unidade. Este ano, já foram contabilizados 500 óbitos pela mesma razão e, segundo o médico cardiologista Cláudio Leonardo, a precariedade estrutural e a carência de leitos e medicamentos podem elevar esse número até 31 de dezembro, último dia da atual administração municipal.
De acordo com o médico, o HGG está funcionando “na base do desespero”. Na terça-feira (6), os profissionais foram notificados da falta do medicamento Noradrenalina — essencial para manter a estabilidade dos pacientes no CTI — e a solução foi pedir empréstimos às unidades médicas conveniadas. “A noradrenalina é o que mantém os pacientes vivos. Não é possível conduzir o Centro de Terapia Intensiva sem esse medicamento. Para amenizar o problema, os administradores conseguiram algumas ampolas em outros hospitais até efetuarem a compra, mas isso se chama ‘gambiarra’. Vivemos nesse círculo vicioso da gambiarra, mas em Medicina não há espaço para improvisos”, lamentou Cláudio.
Além da Noradrenalina, outros remédios considerados parte da “cesta básica” do hospital, como a Ranitidina; antibióticos; medicamentos utilizados para o tratamento de insuficiência renal e infarto; fitas para medir glicose; e sondas também estão “em falta”. De acordo com o médico, os trombolíticos, utilizados em pacientes com trombose, são “ultrapassados” e podem gerar efeitos colaterais de médio e longo prazo em quem os consome. A carência chegou até mesmo ao Centro Cirúrgico: cirurgias de emergência foram desmarcadas por não haver estrutura para efetuar os procedimentos. “Ao invés de avançarmos, estamos regredindo na Medicina. Isso é frustrante!”, confessou.
Estrutura
A estrutura precária da Unidade é outra preocupação do médico. Segundo ele todos os setores do HGG estão sem ar condicionado, inclusive a Sala Vermelha (destinada a emergências de alta gravidade); e faltam ainda equipamentos fundamentais para a execução de exames, como o tomógrafo, por exemplo. No entanto, para Cláudio, o problema mais grave é a carência de leitos na CTI — situação que teria sido a causa de inúmeros óbitos.
“Eu tenho dez pacientes no corredor que receberam indicação formal de transferência para a CTI, mas que não puderam ser levados devido à falta de vagas. Tenho outro paciente que está há quatro semanas na sala de estabilização da emergência, quando também deveria estar no Centro de Terapia. O pior é que a administração do hospital até corre atrás, mas esses profissionais não têm poder de resolução. Então posso afirmar que a prefeitura está levando a saúde ‘nas coxas’ para que nova administração assuma e resolva essas questões”, contou Cláudio.
O médico disse ainda que a diálise — procedimento efetuado em pacientes com insuficiência renal — acontece dentro da sala de emergência, o que, para ele “não tem cabimento”. “Para ‘maquiar’ a situação, criaram duas novas enfermarias, mas na verdade eles estão utilizando um consultório e sala de repouso dos médicos para colocar pacientes em macas de ambulância, porque nem isso temos. Você sabe quantos centímetros de largura tem uma maca de ambulância? Apenas 50 cm! Pacientes acima do peso precisam escolher de que lado irão apoiar o corpo. E ao lado da sala de pacientes graves há um monte de sujeiras... Dá nojo fazer Medicina desse jeito. É ridículo! Frustração total. Eu não fiz Medicina para isso. Fiz para tratar as pessoas, mas aqui é impossível”, desabafou.
Quanto à nova administração municipal, que começa no dia 1º de janeiro, o médico disse ter esperanças. “Espero que o próximo governo tome as providências cabíveis, afinal, com medicina não se brinca. E se não acontecer, continuarei vigilante”, concluiu.
Sempre respeitando o princípio do contraditório, a equipe de reportagem do Terceira Via entrou em contato por e-mail com a Superintendência de Comunicação Social, responsável por emitir notas dos demais órgãos da Prefeitura de Campos, mas não obteve resposta até o fechamento desta matéria. Ainda assim, o jornal aguarda e publicará a versão da Secretaria de Saúde para este fato.
Contexto
Desde agosto do ano passado, o médico tem feito inúmeras denúncias ao que ele chama de “caos na saúde” e, por isso, sofreu retaliações, sendo inclusive afastado do HGG por seis meses. Nesse período, Cláudio trabalhou em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) na Baixada Campista onde, segundo ele, não há sequer dipirona: “o boteco da esquina é mais equipado que os postos de saúde”.
Devido à retaliação, o médico, que é concursado, entrou com uma ação de indenização, mas até o momento o processo não avançou na Justiça.
Ulli Marques
Terceira Via.
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