sexta-feira, 1 de abril de 2016

A juíza, o fogo e o desespero



A Justiça brasileira é composta por magistrados, promotores, procuradores, defensores, advogados e serventuários.

Isso não quer dizer que - com esse corpo de profissionais - a sociedade seja atendida com a qualidade mínima que se espera. Afinal, muitos dos pedidos são de extrema urgência e precisam de uma resposta estatal rápida para que não haja prejuízos para os reclamantes.

Com a morosidade que assola o Judiciário - em todas as suas instâncias - a chance de um cidadão ter o seu pleito atendido em prazo razoável é quase nula. Ao passo que o vergonhoso jargão que diz a “Justiça hoje beneficia os réus” (devido à demora) é cada vez mais correto.

Como advogado, afirmo que não é fácil ser parte em um processo judicial. As ações demoram a ser julgadas e inúmeras pessoas são sacrificadas aguardando uma indenização, o exame de DNA, a audiência de conciliação, o alvará de soltura ou a simples digitação de um ofício.

E quando o desespero bate no coração daquele que precisa de uma decisão judicial? Qual a solução? E quando essa morosidade pune inocentes que ficam atrás das grades aguardando por tempo indeterminado que seus recursos sejam analisados?

Essa semana, a sociedade brasileira ficou estarrecida com um fato irracional ocorrido dentro de um fórum de justiça.

Um homem armado com explosivos e garrafas de coquetéis molotov invadiu a sala de uma juíza no Fórum do Butantã, na zona Oeste de São Paulo, para ameaçá-la de morte, na tarde da última quarta-feira (30).

Alfredo José dos Santos manteve a juíza refém, agrediu e jogou álcool nela, ameaçando atear fogo. Santos, o agressor, segurava a magistrada pelo pescoço. Ele foi rendido por policiais e preso.

A juíza, da Vara de Violência Doméstica, foi socorrida e levada ao Hospital Albert Einstein. Ela vai se recuperar. O homem foi preso.

Santos tinha uma audiência às 14h em razão de uma acusação de agressão contra a mulher pela Lei Maria da Penha - e se dizia inocente da acusação.

Não restam dúvidas que essa atitude merece severa punição, afinal qualquer agressão, seja contra um magistrado ou ao mais humilde servidor - profissão digna, se diga de passagem - merece uma medida judicial enérgica.

Por outro lado, tão repugnante quanto a atitude desse réu é a situação de milhares de pessoas que morrem aguardando a revisão de uma pensão, que agravam suas enfermidades pois não conseguem que um juiz defira, em tempo hábil, uma liminar para internação ou cirurgia.

Portadores de doenças crônicas vagam como zumbis nos corredores das defensorias públicas do país mendigando por acesso à Justiça. Para grande parte deles só resta orar.

Tentar queimar uma juíza é algo abominável e merece todo o nosso repúdio. Contudo, nesse momento de consternação é sempre benéfico lembrar que o sofrimento é subjetivo e a sua intensidade também.

Todos nós somos responsáveis por nossos atos e esse cidadão pagará pelo seu. Todavia, quem paga pelos prejuízos indenizatórios, pelas vidas perdidas, anseios e sonhos destruídos pela morosidade processual ou pelos erros judiciais?

Como bem disse o escritor português José Saramago: “O homem deixou de respeitar a si mesmo quando perdeu o respeito por seus semelhantes”.

Minha Coluna de hoje não é de fracasso, mas de luta e esperança.

Que tal refletirmos?

Cláudio Andrade

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