Jornal Terceira Via
A sociedade brasileira vem acompanhando uma evolução gradativa na investigação e apuração de crimes cometidos por políticos nas esferas dos poderes Executivo e Legislativo.
Apesar dessa evolução, ainda perdura a dificuldade de se identificar o “homem por detrás das ações”. Sim, isso mesmo. Aquele homem que ordena, distribui tarefas, exerce o poder e, após o fechamento da ação, assiste de camarote ao desenrolar de sua criação.
“No julgamento da Ação Penal nº 470 (Mensalão), o Procurador Geral da República, Roberto Gurgel, acertou ao afirmar que os chefes de quadrilha não mandam ordens por escrito, não combinam os golpes por telefone ou por e-mails”.
Até hoje, persiste a dificuldade de se encontrar o elemento oculto, o que faz com que muitos agentes públicos se livrem de punições. Isso se deve, entre outros fatores, à maestria que esses elementos têm de se manterem envoltos por uma estrutura sólida que vai da troca de favores e pagamento de propina a outras práticas nem um pouco nobres.
O jurista Heleno Fragoso constatou a necessidade de se buscar esse elemento oculto. E diante dos empecilhos para tanto, abriu-se uma brecha, utilizada inclusive para condenar José Dirceu, pela prática do crime de formação de quadrilha. O eminente legislador disse: “... seria autor não apenas quem realiza a conduta típica, objetiva e subjetivamente, e o autor mediato, mas também, por exemplo, o chefe da quadrilha que, sem realizar a ação típica, planeja e decide a atividade dos demais, pois é ele que tem, eventualmente em conjunto com outros, o domínio final da ação.”
A linha apresentada por Fragoso precisa ser efetivamente utilizada para que se possa, mesmo que de forma gradativa, encontrar os grandes chefes que, de tão bem ocultados, parecem personagens de uma lenda urbana.
Enquanto esses andarilhos das sombras tiverem a facilidade de se manterem intocáveis, o erário continuará sendo lesado com o desvio cada vez maior de quantias que poderiam, se bem administradas, servir de forma direta e inequívoca aos contribuintes do país.
A ótica do crime maior é um mal de grandes proporções. Quando milhões de reais são desviados, a população não consegue entender, de imediato, que tal delito a afeta de forma direta.
Para o reconhecimento dos elementos que agem por detrás das cortinas, o Judiciário precisa deixar de ser uma ilha. Isso porque suas decisões são pautadas nas circunstâncias em que atuam e isso foge à dura realidade.
Por isso, a busca pelo ser oculto ordenador é imperiosa uma vez que, na situação atual, algumas condenações são meros paliativos que estancam o sangramento, mas não fecham a ferida.
A dificuldade de identificação do chefe articulador alimenta mal a carente memória do eleitor/contribuinte. Como dizia Millôr Fernandes: “a cada quinze minutos o brasileiro esquece os últimos quinze”.
Assim, não nos esqueçamos de que o homem oculto existe e deve se tornar ostensivo muito antes dos quinze minutos finais.
Cláudio Andrade
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