domingo, 19 de abril de 2009

PROPOSTA ESCANDALOSA.

O artigo "Proposta escandalosa" é de autoria do presidente da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais do Conselho Federal da OAB, Valmir Pontes Filho, e foi publicado na edição de hoje (18) do jornal O Povo, do Ceará:

"Dias atrás este jornal (O Povo-CE) publicou artigo em que defendi, com ênfase, o Senado da República. Não mudei de idéia em relação à própria existência da instituição senatorial, mas confesso que recente decisão ali tomada me encheu de indignação. Na verdade, me vi estupefato diante dela.

Refiro-me à aprovação, quase à sorrelfa e com evidente atropelo de limites formais e substanciais da Constituição, da proposta de emenda constitucional (PEC) nº 12, por via da qual se pretende autorizar o Poder Público a pagar, em percentuais mínimos e a perder de vista, os precatórios judiciais, sob a desculpa de que Estados e Municípios, principalmente, precisam ter "folgas financeiras e orçamentárias". Trata-se de mais um adiamento injustificado do cumprimento de obrigações pecuniárias do Governo, a importar a prática de escandaloso calote público e, por conseqüência, a desmoralização do Poder Judiciário, de onde emanam essas ordens de pagamento.

O que a ninguém pode escapar é que, a dar sustentação aos precatórios, estão sentenças judiciais transitadas em julgado, a que ninguém, mormente à autoridade pública, é dado descumprir. Afinal, se o dever primeiro e indeclinável do administrador é o de cumprir a lei de ofício (Seabra Fagundes), maior ainda é a sua obrigação de dar efetividade às decisões soberanas do Judiciário. Proibido lhe é, constitucionalmente, engendrar artimanhas legislativas para escapar disto.

Se à entidade estatal é conferida a absurda prerrogativa de pagar esses precatórios apenas daqui a cem meses ou mais (a não ser que o credor se submeta a um imoral "leilão" do seu crédito), na verdade se lhe está a outorgar a capacidade de lesar quem queira e pagar as indenizações respectivas quando bem lhe aprouver. Volta-se, com isto, à época em que vigia a irresponsabilidade total do governante. Coitada da viúva, a quem o Erário sonegou a devida pensão, mas que, tendo vencido querela judicial, só terá o que lhe cabe na eternidade.

Nada mais ofensivo à dignidade das pessoas, à independência do Judiciário e à própria essência e natureza do Governo Republicano do que tal iniciativa dos atuais Senadores. Ainda mais quando o segundo turno de votação, ao que consta (e como tem habitualmente ocorrido), se realizou minutos após o segundo, em clara ofensa à regra do art. 60, §2º, CF, cujo intuito é o de dar ao parlamentar a oportunidade de refletir sobre a grave decisão que tomou (de mudar a Lei Suprema do país). Espera-se que, na câmara dos deputados, mereça a proposta o destino adequado: imediato arquivamento.

A PEC 12 não é apenas política e socialmente inadmissível, mas esfericamente inconstitucional, inclusive por sobrepor o Executivo ao Judiciário. E isto, é claro, a democracia não tolera".

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